domingo, 15 de março de 2009

No reino do cada um por si

(por Alexandre Pelegi)

Somos verbais em excesso. Adoramos 'falar sobre', como se a palavra, por si, resolvesse qualquer problema. Pois não é assim que agem os políticos? Eles estão sempre "tomando providências", "determinando ações urgentes", "organizando e montando comissões específicas".

Como somos repetidores do mesmo mal, não prestamos atenção ao que deveria vir após o verbo - a ação! Eles nos fazem promessas, e a gente não cobra. Eles nos garantem mudanças, e a gente não acompanha...

A palavrinha cidadania é repetida por muita gente e poucos entendem seu significado. Digo isso ao perceber que muitos não têm respeito à regra da convivência como valor.

Vou dar alguns exemplos: quanto mais caro o carro, mais provável é o sujeito jogar o lixo pela janela; quanto mais rico, mais provável abusar da arrogância e da prepotência; quanto mais alto na escala social, mais comum dizer "você sabe com quem está falando?". Vou parar por aqui... Li outro dia um texto atribuído ao jornalista Michael Kepp, norte-americano radicado no Brasil há mais de 20 anos. Surpreendi-me com uma observação sobre nosso povo, que eu reparto com todos:

"Os brasileiros não se habituaram a exercitar seus direitos pela ação coletiva. Formou-se uma sociedade com uma visão antagônica em relação à lei, como no dito popular: para meus amigos tudo, para meus inimigos, a lei".

Você se incomoda ao ouvir isto? Eu não, pois sei que é assim que temos vivido há décadas. É um grave erro genético em nossa formação, e que por isso mesmo exige e reclama correção.

Afinal, uma das condições necessárias para a democracia é que todos reconheçam que temos, todos, os mesmos direitos. Olhe sua cidade com um olhar crítico e distante e responda: os ambientes que construímos nos conduzem ou nos afastam da democracia? Pois é... No reino do cada um por si, falar de cidadania é hipocrisia da brava.

Mas se você não quer ouvir frase de estrangeiro, encerro então com esta pérola do brasileiríssimo Millôr Fernandes, que ilustra, de maneira lapidar, nosso famoso jeitinho de ser:

Nossa liberdade começa onde podemos impedir a dos outros.

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